Férias em família no Alentejo

Chovia bastante e o frio que se fazia sentir mostrava que era um verdadeiro dia de inverno. Junto à lareira, olhava pela janela e via os ramos das árvores dançarem ao ritmo do vento. Senti-me agradecida por poder estar em casa. Levantei-me do sofá e fui até à gaveta das recordações. Hoje, não era dia de viajar com os meus clientes. Era o dia perfeito para uma viagem de memórias. 

Agarrei em alguns álbuns e levei-os até ao aconchego da manta que tinha no sofá. Comecei por abrir um. Imediatamente, saltaram-me à vista fotografias de família, onde as celebrações de casamentos e aniversários tomavam o papel principal. De repente, surgiu-me um postal à solta e a minha expressão foi inundada por um enorme sorriso. Era um postal com uma bonita fotografia de Paris. Nas costas era possível encontrar as seguintes palavras:

Querida família,

Já chegámos a Paris. Obrigada pela forma como nos receberam no Alentejo. Já tínhamos muitas saudades. Recordamos cada dia das nossas férias em família, com um imenso carinho. Foi bom regressar às origens e carregar a bateria do coração. Paris é a cidade da luz e do amor. No entanto, o nosso Alentejo tem um brilho especial e o nosso coração salta só de pensar nas suas gentes e nas suas planícies.

Beijinhos,

Família Silva

Era um postal dos meus primos que estão emigrados em França. Recordo-me perfeitamente desses dias. Foi mais ou menos há uns cinco anos. Era agosto e como sempre acontecia, lá vinham eles de malas e bagagens para visitar a família e a terra. Em vez de rumarmos a sul e aproveitarmos as praias algarvias, decidimos percorrer parte do Alentejo. Queríamos passar tempo juntos, tempo de qualidade na terra que nos tinha, a todos, visto nascer.   

A primeira paragem # Marvão

# Marvão

# Marvão

# Marvão

# Marvão

# Marvão

A primeira paragem foi Marvão. Localizado numa paisagem idílica serviu de cenário para milhentas fotografias. Ficámos alguns dias e percorremos cada centímetro daquelas ruelas calcetadas. Acordávamos cedo, pois não queríamos perder o nascer do sol. Era magnífico ver todo aquele conjunto amuralhado ser inundado pela luz de um novo dia. O seu grau de preservação fazia-nos viajar no tempo e sentir como parte integrante da história.  Fomos a Castelo de Vide e percorremos toda a sua antiga judiaria. Era impossível imaginar os tumultos por que passaram milhares de judeus aquando da sua perseguição. Como não poderia deixar de ser, subimos à majestosa Senhora da Penha. É um local que nos apela à reflexão e à contemplação. A vista, tal como a paz que transmite, são únicas. Que belo início de férias.

Segunda paragem # Elvas

# Elvas

# Elvas

# Elvas

# Elvas

Prosseguimos viagem, desta vez até Elvas. Ficamos alojados perto do aqueduto da Amoreira, que monumento incrível. Da janela do quarto, conseguia ver ao longe, o Forte da Graça. Era curioso como uma cidade tão calma tinha estado envolvida em tantos confrontos. A Elvas devemos, em parte, a nossa Independência de Espanha. Percorremos várias vezes o centro histórico. Habitado por uma população bastante envelhecida eramos muitas vezes brindados por dois dedos de conversa numa esquina ou na porta de casa, por algum habitante. Quando percebiam que também eramos alentejanos, ficavam surpreendidos. Normalmente, os seus visitantes vinham de fora. 

Tal como acontece com qualquer família, a hora da refeição era sempre uma forma de partilha. No nosso caso era também uma forma de matar saudades. Os sabores alentejanos são inconfundíveis, representando casa e aconchego. Sopa de tomate, migas de porco ou sopa de cação, cada prato uma história, cada sabor uma viagem até casa. Os meus familiares emigrantes tinham essa ideia bem presente. Era notória a forma como saboreavam o pão, as azeitonas ou o queijo e os enchidos. Já que ali estávamos, deliciámo-nos com as famosas ameixas em calda que acompanham o doce tradicional Sericaia. Havia felicidade em cada momento.

Terceira paragem # Vila Viçosa

# VilaViçosa

# VilaViçosa

# VilaViçosa

# VilaViçosa

# VilaViçosa

De Elvas, seguimos para Vila Viçosa. A “princesa” do Alentejo. A monumentalidade respirava-se a cada passo. Visitámos o Paço Ducal e entre as suas paredes dei por mim a imaginar como seria uma festa, um banquete ou um baile naqueles salões majestosos. Visitámos todos os museus, subimos ao castelo. À noite, aproveitávamos a temperatura se que se fazia sentir e passávamos várias horas a conversar numa das esplanadas da praça central. Os meus primos, invejavam a vida naquela terra, as pessoas sorridentes que interagiam de forma calma e serena. Em Paris, havia muitas coisas, mas não havia aquela qualidade de vida. Acho que é um dilema pelo qual passam muitas pessoas. A dualidade entre melhores condições monetárias e o aconchego do coração. Postos numa balança qual o prato que pesaria mais? 

Quarta paragem # Estremoz

# Estremoz

# Estremoz

# Estremoz

# Estremoz

# Estremoz

# Estremoz

Num sábado decidimos ir até Estremoz. Não era longe do local onde estávamos. Fomos ao mercado de frescos e velharias. Os meus primos não conseguiam esconder a emoção. Pareciam crianças de olhos arregalados perante um brinquedo. Como é que simples objetos têm o poder de nos transportar na nossa memória para locais tão longínquos? Partilhámos histórias do antigamente, nas quais, os mais velhos refiam como utilizavam determinado objeto. A cidade continuava com todo o seu encanto. Os tons do mármore branco refletiam a limpeza e o cuidado daquelas gentes, pela sua terra. Cada rua tinha o seu encanto próprio e naquela torre de menagem, assistimos a um belíssimo pôr-do-sol. 

Quinta paragem # EvoraMonte

# EvoraMonte

# EvoraMonte

Seguimos para Evoramonte. Localizada num alto, consegue observar-se a quilómetros de distância. Os habitantes concentram-se na parte de baixo, mas nós optámos por ficar dentro das muralhas. Num dos dias, amanheceu com um denso nevoeiro. Parecia um local místico, retirado de uma cena de filme. 

Sexta paragem # Evora

# Evora

# Evora

# Evora

# Evora

Continuámos rumo a Évora, um dos ex-libris do Alentejo. Havia muitos turistas e é engraçado quando passamos a ser turistas na nossa própria cidade. Tudo ganha um encanto diferente. Os locais pelos quais passamos todos os dias, são olhados de forma diferente. Há contemplação. Mostrei-lhes os meus locais favoritos. Levei-os ao cimo da Sé Catedral, visitámos o Templo Romano e a famosa Capela dos Ossos. Fora da cidade, fomos até ao Cromeleque dos Almendres e à Anta do Zambujeiro. 

Sétima paragem # Monsaraz

# Monsaraz

# Monsaraz

# Monsaraz

O último destino foi Monsaraz. Para mim, é uma das joias da coroa. Não há nenhum outro local assim. Envolvido pelo grande lago de Alqueva, do alto de Monsaraz consegue contemplar-se mais. Mais do que os olhos conseguem ver, mais do que os sentidos conseguem sentir. Cada casinha parece de brincar e está tudo tão perfeitamente harmonioso na paisagem, que se torna único.

Como não podia deixar de ser, em terra de vinho tínhamos de ir a algumas adegas. Visitámos, degustámos e ficámos com a certeza que no Alentejo se produzia o melhor do líquido dos deuses. Branco ou tinto, o importante é saber apreciar. Com tempo, no local certo e acompanhado dos melhores produtos. Brindámos a nós e às nossas férias. Que aqueles momentos se repetissem vezes sem conta e que o Alentejo fosse sempre o nosso anfitrião. 

Diz-se que quando estamos felizes, nem damos pelo tempo passar. Era verdade. Tinham passado duas semanas. Depois de vermos o nascer e pôr-do-sol, quase todos os dias, era hora de dizer adeus. No coração levávamos uma certeza. A família não se escolhe, mas com todos os seus defeitos e virtudes completa-nos e mostra-nos quem realmente somos. O nosso Alentejo era casa. Era a minha casa de todos os dias e continuava a ser casa de quem já há alguns anos tinha partido. Em qualquer parte, em qualquer local havia espírito de pertença e certeza de querer voltar. 

Sorri ao rever tudo isto. Foi uma verdadeira viagem de emoções e recordações. Viajar é sempre bom, mas viajar com quem gostamos é ainda melhor. A chuva tinha parado e o sol começava a aparecer. Amanhã seria um bom dia, e eu, poderia escrever mais algumas páginas de novas histórias, pelos caminhos do meu Alentejo.